sábado, 17 de junho de 2017

A DOR, O SOFRIMENTO E A VIDA CRISTÃ

                                        

 Durante anos fui ensinado de modo completamente hipócrita com relação a dor e as aflições.  Há um mundo de faz de conta na vida de muitos cristãos. Na verdade muita gente que professa a fé cristã é completamente hedonista e humanista por causa da superficialidade como é encarada o sofrimento. Tudo aquilo que aflige o homem parece vir do diabo, defendem esses superficiais. O resultado foi uma geração de cristãos que não compreendem o desígnio da dor e da aflição, não encontram nenhum valor no sofrimento, não conseguem produzir perolas em meio as intensas dores. O resultado é avassalador, para não dizer um escândalo.
Eu li o livro de Randy Paush “A lição Final”. Randy contraiu câncer, lutou contra a doença, mas de forma simples, encarou os fatos e viveu seus últimos momentos com uma sabedoria muito intensa. Paush morreu em 2008, seu legado foi uma ultima aula que deixou na internet e atraiu a atenção de muita gente. O livro “A Lição Final” eu li em paralelo com o livro de Eclesiastes. Uma experiência incomum. Acho interessante como uma pessoa pode encarar os fatos da vida de forma real, sem fantasias. E a bíblia não nos leva para um mundo de fantasias quando o assunto é sofrimento. Não importa de que modo vem a aflição, a dor e o sofrimento, ou como se experimenta, física ou emocional, na verdade ela é um fato real na vida de qualquer cristão, precisamos entender isso.
Mas, todavia, a cristandade tem polido a mensagem “não sofra mais” ou com a promessa “Venha a Cristo e todos os seus problemas serão resolvidos”. Uma geração avessa a dor foi desenvolvida a partir da mensagem fantasiosa de que o céu torna-se a realidade imediata de quem serve a Cristo nesse mundo. O resultado  segue em linhas opostas, gente que se decepciona e se afasta da fé cristã e outros que se auto-enganam e continuam em suas fantasias.
Há um livreto muito bom, escrito por H. L. Roush: A Benção da traição” o autor discorre sobre a sua experiência de amargura por ter sido traído por um amigo que ele confiava e fazia parte do circulo de comunhão cristã. Não estamos livres, nenhum cristão está livre das duras aflições da vida. Seja em suas múltiplas formas,a dor chega, de uma maneira ou de outra, mas cedo ou mais tarde, e ela vem dentro do propósito de Deus, pois na vida de um verdadeiro cristão,  ela sempre esta dentro dos domínios soberano de Deus. Não somos chamados para questionar, mas para suportar.  Paulo ensina que devemos ser pacientes na tribulação (Romanos 12:12) a palavra grega aqui em romanos é “Thlipsei” Jesus usa essa mesma palavra em João 16:33 quando afirmou : “No mundo tereis aflições” e significa angustia, tribulação, aflição etc. Cristo nunca prometeu aos seus seguidores que eles estariam isento dessas coisas. A glória do evangelho foi lapidada na aflição da cruz e brilha na piedade dos que suportam a dor quando passam por esse mundo caído.
Alguns anos atrás, uma irmã da nossa comunhão cristã contraiu câncer, depois de muito lutar contra a doença, ela partiu. Sei o quanto é angustiante tudo isso. É um mistério, o sofrimento humano. Mas estamos no estagio em que a natureza geme com dores de parto aguardando a redenção. A cruz é de alguma forma, parte da vida humana, de todos, inclusive dos redimidos. Mas sempre que alguém fica doente, como foi o caso dessa irmã, há sempre a perspectiva da cura. Quase sempre tudo gira em torno disso.  Por causa do misticismo e das experiências extra-biblicas, surgiram falsas profecias e palavras que eram opostas as evidencias. Até que se entenda os desígnios de Deus, tudo vai ficar encerrado na hipótese emocionalista.  Raramente alguém ora “seja feita a tua vontade” nas horas mais difíceis da vida. Quando vem a tribulação oramos para que Deus faça a nossa vontade, porque somos ensinados que a tribulação é uma desordem da vida espiritual, quando na verdade pode ser um chamado para colocar a nossa vida em ordem. Assim com a morte daquela irmã evidenciando que a emoção e o misticismo não pode tomar a ordem das coisas nem ter o controle absoluto da tribulação. A dor da perda torna-se confusa, o evangelho desacreditado e os propósitos de Deus obscurecidos.
Assim como é certo que o mundo jaz no maligno, de alguma forma, a condição humana jaz no sofrimento. Paulo diz que o nosso homem interior se corrompe, mas nosso homem interior deve ser renovado dia após dias.
J. W. Follette escreveu um artigo que todo cristão deveria ler: “A Tribulação, uma serva” Follette com uma piedade e um discernimento profundo, discorre sobre esse assunto, a aflição, com uma cosmovisão muito bem estruturada nas escrituras. O cristão deve tomar a tribulação como um escravo, pelo qual deve obedecer aos propósitos de Deus. Para Follette, Deus permite a tribulação na vida do cristão, para o aperfeiçoamento do caráter, aliás no inicio do artigo, o autor já explica que o Senhor permite o problema e a tragédia para testar a fé e o caráter de um cristão. Há um propósito na escola da espiritualidade cristã. O sofrimento foi uma serva na vida de missionários, teólogos, pastores, e é certo afirmar que o fio escarlate da redenção liga todos os livros da bíblia, também é correto afirmar que a dor também é uma luz que está acesa durante todo o trajeto da história da igreja.
Não sejamos infantis! Olhem para os primeiros séculos da igreja, como os irmãos sofreram as duras perseguições e morriam esfolados, afogados e queimados, devorados pelos leões e expulsos de seus lares.  A glória da coroa de um crente corresponde a dor que suportou em Cristo nesse mundo. Porém, hoje, uma multidão vai para as igrejas em busca de respostas pares seus problemas sejam ele financeiros, matrimoniais ou sentimentais. Não que de alguma forma isso seja errado, acredito que Deu abençoa seus filhos, e nem mesmo posso omitir que a benção esteja escondida numa dura prova. Porém o centro da mensagem cristã não é a resolução dos problemas existenciais do homem, mas sim do maior de todos os problemas, e esse de caráter eterno: o perdão de seus pecados.
Seguir os passos de Cristo é trilhar as veredas das aflições para chegar na glória. O caminho da vida cristã é cercado com as farpas da tribulação, com os espinhos das aflições, mas nem por isso, as flores deixarão de desabrochar.  A escola da dor é mais eficiente do que os prazeres do mundo (Eclesiastes 7:3). Porem queremos evitar-las, porque sofrer, na mentalidade de muitos teólogos é evidencia de falta de fé e evidencia de pecados. Ser pobre é uma maldição e toda doença é diabólica. Tudo isso é errado, porque doenças, dores, morte, tudo isso faz parte do estagio atual.
 A dor é parte constante da vida humana. Ela é um mecanismo deformado pelo pecado. Vivemos sofremos e morremos, isso ocorre com salvos e não salvos.  A vida segue ciclos como na natureza, amanhecer e madrugada, dia de sol e nublado, primavera, outono, verão e inverno. O livro de Eclesiastes e o livro de Jó exploram isso de forma bem clara. Jó é o justo que sofre as duras provações da vida. O Livro de Jó é um oceano de dor e é um homem santo que dá um mergulho lá. No salmo 73 Asafe questiona o fato do ímpio prospera e ele passar por apertos. José passa por duras aflições desde a inveja de seus irmãos até permanecer no calabouço de uma prisão fria por causa de uma falsa acusação contra ele. Paulo afirma que a nossa leve e momentânea tribulação produz um peso eterno de glória mui excelente. (II Coríntios 4:17) Tia ensina que devemos nos alegrar quando passarmos pelas tentações (Tiago   ) devemos entender que há propósito divino na dor e nos problemas que nos afligem. Mas essa geração não quer passar pela universidade do sofrimento.  Embora J. W. Follette com muita sabedoria ensinasse que a tribulação é uma serva, a maioria dos cristãos tornam-se servas da tribulação. A teologia enferma ensinou que um cristão não pode passar por apuros, não pode passar por problemas. Durante anos ouvi pessoas “evangelizarem os perdidos” com o jargão “Jesus te cura, resolve teus problemas” ou “venha para Cristo e todos teus problemas serão resolvidos”. É verdade que na vida cristã, tudo o que causa dano e provem do inimigo precisa ser tratado por Deus, porém aquilo que Deus permite tem um propósito. O processo que ele usou para colocar os santos num patamar de honra sempre foi pelo caminho do sofrimento.  
 Claro, não entendemos porque tantas coisas fogem da nossa compreensão. Somos limitados, e por isso, a fé e a confiança na santidade divina devem ser sempre lâmpadas que iluminam nosso caminho espiritual. Porém entendemos que todas as coisas contribuem para o bem daqueles que amam a Deus (Romanos 8:28). As paginas do Novo Testamento mostram a vida como ela é. João Batista é decapitado, Tiago foi transpassado pela espada, Antipas foi morto por ser testemunha de Cristo, Paulo sofreu muitos açoites, naufrágios  um terrível espinho na carne. Tudo indica que Maria perdeu seu esposo José, muito cedo, Cristo sofreu todas as dores na cruz do Calvário, almas clamam diante do Trono de Deus porque foram decapitadas por causa da fé em Jesus Cristo. Essa é a vida cristã.  Nesse estagio da vida, do nascimento a morte, temos a experiência de vida de um mundo caído. Quando nascemos de novo, pela regeneração, o velho homem fica, até a morte, a redenção começa pelo espírito do homem, e segue outros processos. Nosso corpo ainda vai ser transformado, assim como também surgirão novos céus e nova terra. Há um descortinar nas paginas do Novo Testamento, e Cristo ensina que no mundo teremos aflições, mas que Deus enxugará todas as lagrimas de nossos olhos, pois lá no final das Escrituras inspiradas, encontramos essa promessa maravilhosa: “ E Deus limpará de seus olhos, toda a lagrima; e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor: Porque as primeiras coisas são passadas”(Apocalipse 21:4). Hoje estamos vivendo essas “primeiras coisas”. Estamos dentro dessa esfera existencial.  A criação geme, o mundo foi afetado pela maldição do pecado, estamos nessa condição até a morte.  Paulo sempre pregou sobre o regozijo no Senhor (Filipenses 4:4) mesmo tendo essa experiência de alegria, Paulo passou por duras aflições, e ele mesmo declarou “Mas de ambos os lados estou em aperto, tendo o desejo de partir e estar com Cristo, porque isto é ainda muito melhor” (Filipenses 1:23). Essa era a perspectiva de Paulo. Ele tinha uma definição correta e real das coisas.  Era um fato! A vida cristã era uma primavera, mas estava afetada pelas tempestades do século presente, por isso ele declarava que o viver era Cristo e o morrer era ganho (Filipenses 1:21). Havia no santo apostolo uma percepção real da vida regenerada num corpo corruptível.  Paulo escreveu sobre o assunto com detalhes em I Coríntios 15. A comunhão com Deus e a vida regenerada nos concede recolher a doçura do maná celeste num deserto caustico que é apenas uma passagem para a terra prometida. A jornada, a peregrinação não é uma viagem muito confortável, mas a chegada, as promessas da vida vindoura serão de tal modo tão cheia de glórias, que o nosso padecimento momentâneo nesse mundo será apenas um fogo que purifica mais o coração, para que estejamos preparados para as maravilhas que nossos olhos contemplarão. Isso significa padecer os restos das aflições de Cristo, para desfrutar das doçuras eternas com Ele. Hoje passamos pelas noites escuras da aflição, a madrugada da dor parece não passar, as nuvens tempestuosas das tribulações escondem a luz do meio dia da vida, mas aos santos é dada essa promessa: “E ali não haverá mais noite, e não necessitarão de lâmpadas nem de luz do sol, porque o Senhor Deus os ilumina; e reinarão para todo o sempre”(Apocalipse 22:4)  Durante a segunda guerra mundial, um judeu chamado de Viktor Frankl sobreviveu as duras provações dos  campos de extermínios nazistas.  Sua história contada no livro “Um Sentido para a Vida” é extraordinária. As experiências narradas no livro são surpreendentes, porque elas não partiram  de alguém que tinha uma cosmovisão cristã. Frankl conta como muitas pessoas conseguem sair dos mais extremos sofrimentos e conseguem suportar as mais terríveis provas sob condição de dor e angustia. Na dimensão da fé cristã,  as aflições devem agir de modo peculiar, pois que temos o fiel Consolador e a bendita esperança de que o sol da justiça brilhará quando a madrugada escura das aflições passar. Devemos sim, aceitar aquilo que é a vontade de Deus, e lutar contra tudo o que não é a sua vontade. Sabemos que Cristo não tardará (Hebreus 10:37) e quando Ele vir, então as cadeias do sofrimento serão rompidas, os grilhões das aflições do mundo presente serão despedaçados. “Mas a nossa cidade está nos céus, de onde esperamos também o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará o nosso corpo abatido, para ser conforme o seu corpo glorioso, segundo o seu eficaz poder de sujeitar também a si todas as coisas” (Filipenses 3:20 e 21)

O Sofrer é um doce perfume na alma consagrada a Cristo

C. J. Jacinto

Clavio J. Jacinto


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